Se não acabarmos com a indústria do fake news, a indústria do fake news acaba com o Brasil. O jornalista Eugênio Bucci mostra isso no artigo de hoje, que colei abaixo. Triste momento que precisa ser superado.
"Na terça-feira o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal
(STF), autorizou a abertura de inquérito para investigar as manifestações
pró-ditadura militar realizadas no domingo. É preciso investigar.
É preciso investigar o horror. Domingo foi um dia de horror. Usando a
Bandeira Nacional como capa de Zorro por cima de trajes que imitam fardas
militares de camuflagem, os circunstantes exigiram medidas exótico-totalitárias,
como o fechamento do Congresso e do próprio STF. Contra o horror, o pedido de
investigação foi protocolado na segunda-feira, dia 20, pelo procurador-geral da
República, Augusto Aras, que cumpriu seu dever funcional. O Brasil precisa
identificar a indústria que está por trás desse pesadelo que vai virando
realidade.
Todos sabemos que o presidente da República é a cereja podre do bolo
infecto. Vestindo uma camisa vermelho-chavista, ele compareceu ao ato em
Brasília e discursou diante de faixas que pediam “intervenção militar já”. Ao
estrelar a matinê lúgubre, o governante antigoverno segue sua tournê como
animador de auditórios macabros e de macabros de auditório.
Não obstante, o próprio Bolsonaro não figura como alvo do inquérito. Isso
significa que, ao menos por agora, não será oficialmente reconhecido o que já é
ululantemente público: que o chefe de Estado patrocina, com seus garganteios
perdigotários, a histeria golpista da extrema direita brasileira. Deixemos isso
de lado – por enquanto. Não há de ser nada.
O que mais conta, neste momento, não é investigar o óbvio comprometimento
presidencial, mas descobrir quem atua, e como, no backstage das vivandeiras
machistas. O decisivo, agora, é saber com que dinheiro, por meio de que
engrenagens de comunicação e com que logística esse movimento se tornou uma
empresa bem administrada. Quem financia esse circo que, enquanto bate palmas
para aquele tal que deu de declarar “eu sou, realmente, a Constituição”,
trabalha para implodir a Constituição federal? Quem gerencia a estratégia? Onde
estão os cérebros por detrás dos descerebrados? Estão fora do Brasil?
Se não quiser virar geleia, a República precisa decifrar o enigma. Para
piorar as coisas, pouca gente ajuda. O presidente da República e as milícias,
num coro afinadíssimo, sabotam as políticas sanitárias, chantageando o povo pela
reabertura de seus comércios, e ninguém faz nada. As oposições entraram em
quarentena moral. É inacreditável. A passividade e a desarticulação das
oposições estarrecem. É nesse deserto desolador que a iniciativa de Augusto Aras
desponta como o único gesto sério contra o golpismo que bate bumbo. Viva Augusto
Aras. Fora ele, só o que temos para protestar contra o anacrônico fascismo
vintage são as frases balbuciadas do neoestadista Rodrigo Maia e – ah, sim – a
decisão tomada pelo ministro Alexandre de Moraes.
Os três pelo menos agiram. Perceberam que não adianta pedir “paciência
histórica” e esperar que as instituições tomem as providências. Ora, as
instituições são vertebradas por pessoas e, se essas pessoas não agirem com
coragem, não haverá como barrar o arbítrio. As pessoas que vertebram as
instituições têm de se mexer e, para isso, precisam do clamor organizado das
oposições. Ou é isso, ou os fascistinhas de WhatsApp vão levar a melhor.
Os fascistinhas de WhatsApp só não levarão a melhor se os crimes sobre os
quais se apoiam forem desmascarados. É aí que entram as fake news. Se quisermos
de fato desvendar a máquina do golpismo, teremos de entender o nexo entre a
indústria clandestina das fake news e o bolsonarismo. Não basta seguir o
dinheiro. É preciso seguir as fake news.
Em sua decisão, Alexandre de Moraes apontou o rumo. Determinou que se
apurem a “existência de organizações e esquemas de financiamento de
manifestações contra a democracia e a divulgação em massa de mensagens
atentatórias ao regime republicano, bem como as suas formas de gerenciamento,
liderança, organização e propagação que visam lesar ou expor a perigo de lesão
os direitos fundamentais, a independência dos Poderes instituídos e ao estado
democrático de direito, trazendo como consequência o nefasto manto do arbítrio e
da ditadura”. Nada mais justo.
Agora, finalmente, as fake news entraram na mira certa. Elas são produto de
uma indústria organizada, profissionalizada, tecnologicamente bem equipada, que
opera por meio de negócios ilícitos e de relações de trabalho clandestinas. Essa
indústria, que é criminosa na forma e no conteúdo – como são, não por acaso, as
próprias fake news –, turbina a propaganda de ódio e promove a fúria
inconstitucional, antidemocrática e antirrepublicana. Essa indústria politiza o
debate sobre medicamentos, bombardeia a credibilidade da imprensa, calunia as
instituições, desacredita a ciência, enxovalha a universidade, demoniza a arte e
fomenta o fanatismo. Ela convence os malucos – alguns dos quais em altos cargos
públicos – de que incêndios na Amazônia não existem e de que o vírus é fabricado
em aulas de marxismo cultural. Essa indústria milionária é o motor do
bolsonarismo. Ou ela vem à luz, ou a treva cobrirá o resto."
Artigo de Eugênio Bucci no Estadão (23/04/2020). (imagem: reamp.com.br) |
Eu diria que já acabou com o Brasil,Brito. Faz tempo que a sabotagem se instalou por aqui... E a co responsabilidade tem muitos nomes...
ResponderExcluirNão se está fora do tema, mas precisamos de um sistema educacional melhor. Abraços
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