Ninguém analisa, ninguém comenta a influência perigosa das pesquisas eleitorais no destino político do país. Bem, pelo menos o Flávio Tavares fez isso, em texto primoroso AQUI, que copio abaixo. Vale ler e reler.
Com as probabilidades matemáticas, agora construiremos as cinzas do futuro?
SÓ PROBABILIDADES MATEMÁTICAS
A enxurrada de “pesquisas de intenção de voto”, em que tudo se resume a
números e probabilidades matemáticas, dá a impressão, até, de que eleição é
coisa supérflua e que nem precisamos dela. Basta que mil ou 2 mil simulem um
universo de mais de 170 milhões de eleitores e, assim, substituam o ato de
votar, fingindo que alguns poucos são o todo. Essa simplificação não será uma
perversão eleitoral quase tão perigosa como outras (do tipo corrupção e mentira)
que transformam a política em lodaçal?
Pouca importância se dá aos projetos dos candidatos e ao que são eles em
verdade. O passado, a experiência e as qualidades de cada um (ou as debilidades)
não preocupam os comentaristas políticos e pouco aparecem na imprensa, no rádio
e na TV. Desinformado sobre quem são os que se apresentam como messias, o
eleitor orienta-se quase só pelos prognósticos numéricos chamados “pesquisas”. E
são tantas que é como se bastasse cotejar uma a uma para que magicamente
substituíssem as eleições...
A escolha fundamental da era moderna - a eleição -, em que a sociedade pode
conhecer as qualidades de quem deva governar, virou no Brasil um tacanho jogo de
probabilidades matemáticas. Escolher presidente da República, governador ou
parlamentares não é indicar os números da Mega Sena acumulada.
A insistência nessa avalanche em que poucos fingem ser milhões, porém, faz
com que a “pesquisa” induza o eleitor a votar “nos primeiros da lista”. Mais do
que decidir, o eleitor aposta, como nos cavalos do Jockey Clube em dia de grande
prêmio, pois ninguém quer perder...
Por acaso não nos serviria muito mais pesquisar sobre a experiência
administrativa dos candidatos e sua dedicação ao que é público?
Assim, Geraldo Alckmin poderia detalhar o que fez ou deixou de fazer como
governador de São Paulo, tal qual Álvaro Dias no Paraná. O mesmo faria Ciro
Gomes, que governou o Ceará e foi ministro da Fazenda, ao substituir Fernando
Henrique Cardoso na Presidência de Itamar Franco. Por outro lado, Marina Silva
contaria o que fez (ou não) quando ministra do Meio Ambiente de Lula e
explicaria por que saiu.
Se as pesquisas se baseassem na experiência e (sem serem simples aposta)
mostrassem o passado, outros seriam os ponteiros.
Fernando Haddad diria por que, como ministro da Educação, abriu o ensino
superior a instituições financeiras que cotizam na Bolsa de Valores e pouco se
interessam em educar. E narraria o que fez (ou não fez) como prefeito
paulistano.
Jair Bolsonaro contaria por que foi reformado na carreira militar, chegando
só a capitão, e por que teve apagada atuação em décadas como deputado do “baixo
clero” da Câmara, passando por nove partidos. E explicaria por que quer resolver
à bala os problemas do País. Significa abolir o poder da polícia e, mais ainda,
da própria Justiça?
Até o Cabo Daciolo diria como o Senhor Deus o fez bombeiro e o mandou
apagar incêndios. Boulos diria como os “sem-teto” ocupam prédios vazios. Amoêdo
falaria da experiência empresarial. Henrique Meirelles contaria de como dirigiu
o Banco Central e fez Lula da Silva se orgulhar de que “os bancos nunca lucraram
tanto” quanto em seu governo.
Cada qual falaria dos seus feitos e o problema é que são tantos (não os
feitos, mas os feiticeiros) que nem se perceberia quem faltasse, como falta
aqui.
Em vez do curriculum vitae concreto, em que o passado ilumine o presente e
aponte o futuro, o tom das pesquisas e do noticiário leva só a números. Agora,
os números nem sequer expressam estatísticas corretas. O exemplo é Jair
Bolsonaro - por um lado, lidera as intenções de votos, mas é também quem tem a
maior rejeição do eleitorado. Em torno de 40% o rejeitam antes de pensarem
noutras alternativas. Algo semelhante ocorre com Fernando Haddad, ainda que com
rejeição menor.
A eleição presidencial não é um plebiscito em que valem só “sim” e “não”. A
arrogante petulância com que Lula e o PT nos governaram, como se o Brasil
começasse com eles (sem História e apenas com “histórias”), abriu caminho a que
as ideias estapafúrdias e violentas de Bolsonaro fossem aceitas de boa-fé em
parte dos eleitores.
Em nome da “governabilidade”, Lula e o PT entregaram a Petrobrás à
bilionária corrupção comandada pelo PMDB e pelo PP. Distribuíram as sobras do
banquete aos demais partidos da base alugada (apelidada de “base aliada”) sem se
descuidarem de reservar para si a sobremesa. E hoje Haddad, candidato do PT, é o
preposto de um condenado e preso.
Quando a Justiça condenou e prendeu corruptos e corruptores ou começou a
investigar grandes empresários e políticos de todos os partidos, o arcabouço
partidário desmoronou ante a opinião pública. Daí em diante, o astuto Bolsonaro,
do “baixo clero” da Câmara, despejou sua fúria de atirador “contra o corrupto
PT”. Não explicou, porém, por que (nas duas últimas campanhas) omitiu à Justiça
Eleitoral bens avaliados em milhões, adquiridos enquanto deputado.
Não só nele, mas entre todos os candidatos, como escrevi aqui em junho, o
palavrório esqueceu-se do que é notório. A politicalha substituiu a política e
votar virou só obrigação de lei. Assim, o grande tema do momento na ciência e na
política mundial está ausente da campanha eleitoral no Brasil. Ninguém fala em
proteger o meio ambiente nem tem ideia de que as mudanças climáticas nos levarão
ao suicídio coletivo.
O único que mencionou o tema foi Bolsonaro, mas para ampliar a destruição
da natureza - em Rondônia, dias antes da facada, prometeu diminuir ou até
eliminar as áreas de preservação ambiental...
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